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Afinal, quanto vale um pôr do sol?

O outono está aí e com ele os céus mais bonitos e todas as estações. Mas, você sabe quanto vale um pôr do sol?

Nessas últimas semanas tenho reparado algo bastante peculiar. Tenho visto inúmeros amigos e familiares postando fotos do pôr do sol em suas redes sociais. Fiquei intrigado com esse comportamento e decidi investigar um pouco sobre o assunto. Inicialmente, imaginei que fosse algo relacionado com isolamento social, tanto pelo efeito psicológico, como pela mudança na nossa rotina. Porém, após comentar com alguns alunos sobre o assunto, outra hipótese me veio à mente.

Já repararam que normalmente o pôr do sol em áreas rurais é mais bonito? Não só o pôr do sol, mas temos uma sensação mais agradável quando observamos paisagens menos urbanizadas. Mesmo a noite, em áreas afastadas dos grandes centros urbanos, conseguimos observar um céu muito mais estrelado.

Isso ocorre pelo excesso de poluição que temos em nossas cidades.

As cores do céu

As diferentes cores que o céu pode assumir tem uma explicação física, decorrente da interação entre a luz emitida pelo sol, com as diferentes partículas que compõe a atmosfera. A maneira mais simples de entender esse fenômeno é pensar na atmosfera como um filtro, que detém parte da luz proveniente do sol antes de chegar aos nossos olhos.

A luz é uma onda eletromagnética e o comprimento de onda determina a cor que observamos. Por exemplo, o comprimento de onda de 0,0004 mm corresponde a cor azul, o comprimento de onda de 0,0005 mm a cor verde e o comprimento de onda de 0,00070 mm a cor vermelha.  O sol emite luz em todos esses comprimentos de onda e em muitos outros que são invisíveis aos nossos olhos. Portando, um raio de luz solar carrega todas as cores.

Quanto à luz incide sobre uma folha de uma arvore, todas as cores são absorvidas por essa folha, com exceção da luz verde, que é refletida. Isso faz com que enxerguemos a folha com a cor verde, pois essa é a luz que chega aos nossos olhos. O mesmo ocorre com os gases e partículas que compõe a atmosfera.

Quando a luz penetra na atmosfera as moléculas de gás absorvem determinados comprimentos de onda e refletem outros. Como nossa atmosfera é composta por principalmente nitrogênio, oxigênio e argônio, há uma tendência de reflexão de ondas eletromagnéticas mais curtas, que estão associadas a coloração azul. Isso faz com que enxerguemos o céu com a coloração azul.

Porém, quando o Sol está se pondo, a luz penetra na atmosfera de lado, não de cima. Isso altera o funcionamento desse “filtro de luz”, pois os raios solares precisam atravessar uma camada muito mais espessa de gás antes de chegar aos nossos olhos. Isso faz com que comprimentos de onda mais longos também sejam refletidos e cheguem aos nossos olhos. Vejam que a medida do comprimento de onda da luz vermelha (0,00070 mm) é maior do que da luz azul (0,0004 milímetro). Por esse motivo, no pôr do sol, também enxergamos a cores avermelhadas e alaranjadas no céu.

As cores da poluição

Alterações na composição dos gases ou a presença de material particulado (poeira) na atmosfera também modificam a forma como esse “filtro de luz” atmosférico funciona. Curiosamente, o aumento de partículas de poeira e outras substâncias produzidas pelo homem pode ocasionar entardeceres mais coloridos. Isso, inclusive, explica o céu colorido nos entardeceres do outono aqui na região sudeste do Brasil. 

Como há uma expressiva diminuição da umidade do ar, pela falta de chuvas, há um aumento de poeira suspensa, além de outras partículas bem maiores do que as moléculas de gás comum. Isso altera a maneira com que a atmosfera reflete a luz e, consequentemente, modifica a coloração do céu.

Porém, isso só acorre quando há um nível baixo dessas partículas na atmosfera, ou quando elas têm tamanho próximo. Essas condições não condizem com a poluição atmosférica típica das grandes cidades, que geralmente produz uma grande quantidade dessas partículas e com tamanho variado.

Isso faz com que ocorra a reflexão de diversos comprimentos de onda, todos de uma vez. O efeito é idêntico daquelas experiências que nós realizávamos na escola, quando misturávamos todas as cores primárias, utilizando as tintas guache vermelha, verde e azul, lembra?

Temos como resultado a cor branca, e justamente isso explica céu esbranquiçado, ou acinzentado, que grandes cidades têm nos dias de inverno. Como não temos a chuva para limpar a atmosfera, essas partículas se matem e se acumulam cada vez mais, roubando a cor do céu.

Foto: Larissa Pessoa – Jornal Cruzeiro do Sul

Porém, o problema não termina aí.

Os poluentes transportados pelo ar fazem mais do que roubar o azul do céu. Eles também aumentam a atenuação da luz direta e dispersa, especialmente quando o sol está baixo, no horizonte. Isso significa que a quantidade total de luz que chega ao solo é reduzida, roubando a diversidade de cores no nascer e no pôr do sol, tanto em brilho como em intensidade. Portanto, o ar limpo é o principal ingrediente para que o nascer e o pôr do sol tenham cores vivas.

A poluição atmosférica no isolamento social

Com o planeta focado em combater a pandemia de Covid-19, a poluição e as emissões de gases de efeito estufa caíram consideravelmente em todo o mundo, como consequência da diminuição da atividade econômica, cancelamento de voos e menor circulação de carros. Em São Paulo, os níveis de poluição atmosférica de 2020 seguem abaixo do mesmo período de 2019, conforme mostram dados do Ipen.

Foto: Ipen, G1

Em Sorocaba, 75,67% dos gases de efeito estufa emitidos para atmosfera são provenientes do setor de energia (combustão móvel, combustão estacionária e energia elétrica), sendo 52,9% do total emissões provenientes de automóveis, conforme mostra o Inventário de Emissões de realizado entre 2002 e 2012 pela secretaria de meio ambiente (SEMA).

Portanto, há indicativos de que a diminuição da circulação de pessoas e da atividade econômica está contribuindo de maneira significativa com a diminuição da poluição atmosférica. Diversas reportagens têm relatado melhorias na visibilidade do céu na região metropolitana, permitindo contemplar novamente o céu estrelado ou o pôr do sol.  Porém, tudo indica que a situação será passageira e, com a retomada de nossas atividades após a crise, provavelmente retornaremos aos níveis de poluição anteriores a pandemia.

Vivemos um momento de grande adversidade, que nos tem feito refletir sobre diversos aspectos de nossas vidas. Acredito que sairemos dessa situação muito mais sábios e resilientes do que entramos. Porém, é fundamental discutirmos nosso modelo de desenvolvimento, sobretudo das coisas que abrimos mão para sustentar nosso modo de vida.

Afinal, quanto vale um pôr do sol?

Lembre-se que além de roubar a cor do céu, a poluição também afeta a nossa saúde.

Gostaríamos de saber o que você pensa sobre esse assunto, comente, compartilhe e não deixe de apreciar os entardeceres de outono! Ah, e se tirar alguma foto, marca a gente: @instafacens 🙂

Até a próxima!

Professor Felipe Hashimoto Fengler

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Eliane
Eliane
3 anos atrás

Tão estanho pensar que foi por causa de um vírus avassalador que algumas pessoas começaram a refletir sobre certos temas e/ou terem alguns vislumbres de uma natureza menos agredida.

Expediente

Jornalista responsável:
Elis Marina de Amaral Gurgel Nunes (MTB 0094600/SP)

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